O padre Adelino Pereira Alves foi o primeiro a ser ouvido na sessão de julgamento, que decorre no Campus da Justiça, em Lisboa. Ricardo Salgado responde por três crimes de abuso de confiança extraídos da Operação Marquês.

Muito ligado à família, tendo mesmo realizado o casamento de um dos filhos do banqueiro, o padre, ouvido como testemunha de defesa do antigo homem forte do Banco Espírito Santo (BES), relatou ao coletivo de juízes que conhece Ricardo Salgado há mais de 20 anos.

“Todos os domingos nos encontrávamos na missa. Havia proximidade humana. Por vezes almoçava ou jantava na casa dele. Não havia barreiras entre nós. Falávamos de tudo um pouco, futebol e da família. Tenho uma relação pessoal muito boa com ele”, contou.

Descreveu o arguido como sendo um “homem íntegro, com valores e regras humanas no campo da família e social, com um porte firme que admira” para depois revelar que o tem acompanhado nestes tempos mais difíceis.

O padre Adelino Pereira Alves revelou ao tribunal: “Sempre foi dizendo que o que o mais fazia sofrer eram os lesados e que tinha solução mas não lhe deram tempo”.

Ricardo Salgado terá algumas vezes tentado explicar à testemunha ‘o assunto’, mas o padre revelou que “não quis saber dessas histórias da comunicação social e outros”.

Na reta final do testemunho de poucos minutos, o sacerdote sublinhou qualidades do arguido. “É uma pessoa que sabe escutar e é de fácil acesso, de uma humildade extraordinária.”

O banqueiro, de 77 anos, pediu ao tribunal a suspensão deste julgamento que começou antes do verão, a defesa apresentou um atestado médico onde lhe é diagnosticado com Alzheimer. O médico neurologista descreve “sintomas de declínio cognitivo progressivo” e “defeito de memória, que limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das faculdades cognitivas”.

No entanto, a sessão arrancou sem que defesa, juízes e Ministério Público tenham falado sobre este assunto.

À entrada para a sessão do julgamento a defesa deixou um apelo.

Em declarações captadas pelas televisões, Francisco Proença de Carvalho disse que “não foi o Dr. Ricardo Salgado que decidiu ter esta doença” e pediu aos tribunais que “não julguem como se estivessem numa rede social”.

“Sistema que instalado nos tribunais não funciona”, diz juiz

Foram diversas as tentativas para ouvir uma testemunha no estrangeiro, mas o Tribunal Central Criminal não conseguiu fazer uma simples videochamada audível e com condições.

Primeiro chegava apenas imagem, depois um feed ensurdecedor. Foram pedidas colunas que não resolveram o problema e tentou-se a ligação três vezes sem sucesso.

A defesa de Ricardo Salgado realizou apenas duas ou três perguntas manifestando a dificuldade de perceção da testemunha (Alain Rukavina, advogado) que estava a ser ouvida. Nem a própria intérprete - nomeada pelo tribunal para traduzir o depoimento - percebia o que era dito.

O juiz presidente levou várias vezes as mãos à cabeça perante tal dificuldade, desabafando: “O sistema de videoconferência deu o que tinha a dar. Não se consegue sequer ligar para o Porto!”.

Por fim conclui, “o sistema que está instalado não funciona”. Aos tribunais é exigido que se uso a plataforma Webex.

O coletivo decidiu depois usar o Whatsapp para tentar inquirir Ricardo Gaspar Carvalho, advogado em Macau.

Ricardo Salgado está a ser julgado por três crimes de abuso de confiança, em causa uma alegada apropriação de mais de 10 milhões de euros.