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Adalberto Campos Fernandes: "Pôr mais dinheiro em cima do sistema de saúde não vai resolver os problemas"

16 abr, 2024 - 07:30 • José Pedro Frazão

Numa reflexão sobre a saúde ao cabo de cinco décadas de democracia, o ex-governante socialista pede mais parcerias com o sector social "e, se necessário, com o privado" para uma resposta de saúde "ao nível do bairro". Na Renascença, Campos Fernandes diz que o país tem que fazer mais prevenção da doença com melhor habitação e educação.

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O antigo ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes denuncia uma "visão burocrática" a favor de um "monstro" na área da saúde que seja "exclusivamente público".

No programa "Da Capa à Contracapa", da Renascença em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, o antigo governante faz o balanço de 50 anos de Democracia na área da saúde e pede criatividade e mais parcerias do Serviço Nacional de Saúde com o sector social para chegar a quem mais precisa.

" Há que ser criativo nessa matéria. O problema do sistema de saúde público - que é bom, completo e de facto qualificado - é que há em determinados setores da sociedade uma visão burocrática para a criação de um 'monstro' exclusivamente público que em determinados locais não consegue lá chegar", afirma Adalberto Campos Fernandes, reafirmando-se como "um social-democrata filiado no Partido Socialista há muitos anos" que defende que o Estado não consegue cobrir todas as necessidades de saúde no país.

O ex-titular da pasta da saúde defende a prestação de "serviços de saúde no bairro" pelo sistema público em parceria com o setor social "e com o privado, se necessário". O objectivo, diz Adalberto Campos Fernandes, é "aproximar os cuidados das pessoas" e reduzir o fosso para as "necessidades não respondidas ".

" Há zonas do país onde é a farmácia comunitária que faz o primeiro contacto com o sistema de saúde", exemplifica o antigo ministro da saúde que lança hoje um livro de reflexão sobre o tema, intitulado "Saúde em Portugal - Pensar o Futuro" onde aborda 50 anos de Democracia e 45 anos de SNS.

Mais dinheiro não é tudo

O professor da Escola Nacional de Saúde Pública detecta um problema de "eficiência" nos gastos com a saúde e recusa a ideia de que basta investir mais no sistema de saúde português.

"Se passamos de [um gasto de] 9 mil milhões de euros em 2015 para quase 18 mil milhões de euros agora, e detectamos ou sinalizamos que há respostas por dar, seguramente que pôr mais dinheiro em cima do sistema não vai resolver essas respostas", afirma Campos Fernandes, favorável a um investimento no "ciclo de vida que antecede a doença".

Entre as apostas sugeridas contam-se a promoção da saúde, ambiente, habitação e educação. " Se nós nada fizermos, chegaremos a doença mais cedo ou em piores condições", insiste no programa da Renascença em parceria com a Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Pouco preparados para envelhecimento

O antigo ministro do PS diz ainda que "não estamos a preparar o país para o desafio demográfico" do envelhecimento da população, denunciando uma estratégia reactiva do país face a uma transição que, defende, devia estar a ser trabalhada num horizonte de 30 anos.

"Precisamos de muitos hospitais de 'agudos' ou precisamos mais de unidades que apoiem as famílias para cuidar dos seus mais velhos?", questiona Adalberto Campos Fernandes, num desafio retórico sobre o que falta fazer para "acautelar essa transição".

O antigo ministro lembra que lançou um programa de hospitalização domiciliária em 2016 "que está a ser um sucesso e claramente tem caminho para fazer", mas pede mais apoio para as pessoas "que querem morrer em casa e estar junto dos seus".

Para este efeito, sugere o ex-governante, a organização não passa apenas por um reforço de médicos, mas também por um "papel sem limites" desempenhado pela enfermagem.

As declarações de Adalberto Campos Fernandes foram produzidas no programa "Da Capa à Contracapa " que analisou 50 anos de Democracia no sector da Saúde, contando ainda com a análise de Inês Fronteira, da Escola Nacional de Saúde Pública.

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  • Acácio Gouveia
    16 abr, 2024 Torres Novas 22:34
    Tem toda a razão o ex-ministro. Infelizmente há muitos políticos que insistem em propagar a ilusão que é imperioso injetar mais e mais € para resolver os problemas dos cuidados de saúde. Por outro lado, muitas das ameaças à saúde a montante dos cuidados de saúde são ignoradas, com a complacência das próprias ordens profissionais. Falo concretamente, do tabagismo e do alcoolismo, entre outras ameaças à saúde. Os interesses económicos sobrepõem-se ao valor da saúde e conseguem controlar políticos, profissionais e, no caso recente da discussão sobre legislação anti-tabaco, os próprios meios de comunicação social.

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