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O regresso dos EUA à cena internacional

14 jun, 2021 - 06:33

Biden veio à Europa retomar um diálogo construtivo, que Trump não praticava. Alguns passos positivos foram dados, mas muito mais é preciso, para humanizar uma economia onde se agravaram as desigualdades e a evasão fiscal. A China foi tema incontornável.

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A América está de volta à Europa. Faz lembrar o início da década de 40 do século passado, quando Churchill aguentava isolado a fúria nazi, procurando o apoio dos EUA. Mas o isolacionismo estava em alta do outro lado do Atlântico e F. Roosevelt, embora dando apoio logístico e financeiro ao Reino Unido, só após o traiçoeiro ataque aéreo do Japão a uma base naval americana do Hawai, Pearl Harbor, em dezembro de 1941, teve condições para envolver o seu país na segunda guerra mundial. E isto porque Hitler cometeu o erro fatal para os nazis de declarar guerra aos EUA. De outro modo talvez os americanos se concentrassem no combate a Oriente, não se empenhando – como se empenharam – em ganhar a guerra na Europa.

Agora o perigo para as democracias liberais vem de dentro do seu próprio território. Trump mantem um quase total domínio sobre o partido republicano, impedindo acordos com o partido democrático que concretizem os planos do presidente Biden. E a UE conta com um Estado membro, a Hungria, que se gaba de ser “iliberal” e tem boas relações com Putin, cuja agressividade contra as democracias ocidentais tem vindo a crescer.

Por outro lado, o Reino Unido saiu da UE e o seu primeiro-ministro, Boris Johnson, mais uma vez recusa cumprir aquilo que assinou quanto ao Ulster (Irlanda do Norte). Mas aí ele não terá o apoio dos EUA, pondo em risco a celebração de um grande acordo comercial do seu país com os americanos.

A China foi tema inevitável destes encontros internacionais. Não foram ignoradas as violações dos direitos humanos por Pequim, que considera o conceito de direitos humanos uma mera invenção ocidental para prejudicar a China. Por isso o partido comunista da China controla a vida privada dos chineses como nunca se viu (a capacidade tecnológica chinesa facilita essa interferência) e não hesita em forçar minorias, como os muçulmanos em Xinxiang, a abandonarem a sua religião e a fazerem trabalhos forçados. Viu-se o que se passou e passa em Hong-Kong e receia-se que Pequim ataque militarmente Taiwan. Por outro lado, a China tem criado ilhas artificiais no Pacífico Sul, ameaçando os países asiáticos da região e o comércio marítimo que por ali passa.

Por iniciativa de Biden será lançada uma espécie de réplica ocidental da chinesa “Nova Rota da Seda”. Trata-se de um programa de infraestruturas de mais de 40 biliões de dólares, beneficiando nações em desenvolvimento até 2035. A ideia é cooperar com a China naquilo em que tal é possível – caso do combate às alterações climáticas, por exemplo – mas ter cuidado com as inciativas económicas chinesas, que em regra envolvem objetivos políticos mais ou menos ocultos. Veja-se o caso do nosso país, em cujos sectores económicos vitais a China ocupou posições dominantes.

A pandemia do covid-19 agravou as desigualdades económicas e a falta de sentido social de um capitalismo que, com o colapso do comunismo, passou a preocupar-se apenas com ganhar dinheiro, muito dinheiro. Ora Biden mostra ter consciência da necessidade de dar atenção às desigualdades económicas, à defesa do meio ambiente e aos direitos humanos, algo que Trump desprezava.

Foi do atual presidente americano que veio o impulso para travar a fuga aos impostos das empresas multinacionais, propondo que não pagassem menos de 15% de IRC. Trata-se, ainda, de obrigar as grandes multinacionais tecnológicas a pagarem impostos sobre os lucros obtidos em cada país, em vez de transferirem esses lucros para onde o fisco lhes seja mais favorável.

É um passo no sentido de limitar a brutal fuga aos impostos por parte de empresas. Mas essa fuga, por parte de inúmeros multimilionários, continuará. Pois se os próprios EUA permitem, no seu território, paraísos fiscais, como é o caso do Nevada, Delaware, Montana, Wyoming, Dacota do Sul, etc., teremos de concluir que o flagelo dos “offshores” está ainda muito longe do fim.

Biden conseguiu combater a pandemia com uma vacinação massiva, recuperando do descaso de Trump. E é também dele que vem o impulso para ajudar os países menos desenvolvidos na vacinação, que aí ainda é muito reduzida.

O semanário britânico “The Economist” afirmava há dias que o Ocidente está a deixar passar a oportunidade do século – não pode haver melhor defesa para a democracia do que um impulso global para vacinar os que não tem meios para, por si, o conseguirem. Com algum atraso, é certo, Biden vai avançar nesse sentido e levará consigo a maioria dos países europeus. Talvez a oportunidade seja afinal aproveitada. O G7 prometeu doar mais de mil milhões de vacinas aos países pobres até ao final de 2022. Mas a Organização Mundial de Saúde considera serem necessários pelo menos 11 mil milhões de vacinas para acabar com a pandemia no mundo.

Comentários
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  • Ivo Pestana
    14 jun, 2021 Funchal 12:26
    Para quê? Nem sabem governar-se.

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