Na melhor das hipóteses, só lá para o fim do ano existirá um governo em Berlim. O que vai implicar inevitáveis atrasos em assuntos em debate na UE.

É o caso do fim da suspensão das regras orçamentais do euro – voltar-se-á em 2123 ao esquema antigo, manifestamente desajustado, por demasiado estrito, mas que parece atrair os países ditos “frugais”, como a Holanda e a Áustria? Ou avança-se para um regime mais amigo do crescimento económico?

Vai pesar muito nesta matéria a posição do próximo governo alemão.

Outra questão que fica em suspenso é a reação europeia ao acordo entre os EUA, a Austrália e o Reino Unido (AUKUS) sobre o fornecimento à Austrália de submarinos americanos movidos a energia nuclear (embora não equipados com armas atómicas).

Como é sabido, a França reagiu com indignação a este acordo, por apenas ter sido informada quando ele estava concluído e por ter assim perdido um grande contrato para fornecer à Austrália submarinos convencionais.

Tal como na saída do Afeganistão, Washington tomou a decisão estratégica acertada, mas falhou na caótica retirada, agora Biden acertou no essencial, mas ofendeu sem necessidade um aliado, a França.

O AUKUS tem uma virtude: pela primeira vez enfrenta a sério a crescente ameaça da China no Índico e no Pacífico. A China tem vindo a invadir numerosas águas territoriais de países da região, bem como a criar ilhas artificiais, onde depois coloca dispositivos militares. Os futuros submarinos nucleares australianos, muito mais rápidos e silenciosos do que os submarinos tradicionais, certamente farão Pequim pensar duas vezes.

Por isso vários países da região – Taiwan, Japão, Coreia do Sul, Filipinas, etc. - reagiram com alívio ao AUKUS.

Pelo contrário, a França reagiu com fúria. Biden tentou, depois, emendar a mão com a França. Macron, que tinha chamado o seu embaixador em Washington (algo até agora nunca visto da parte do primeiro aliado dos EUA), já o mandou de volta à capital americana.

Perante esta desconsideração de um país da UE por parte dos EUA voltou a falar-se em França de uma defesa europeia, com autonomia estratégica em relação a Washington. Assunto que abordarei na coluna de sexta-feira próxima.