Primeiras impressões

Mulheres votaram mais à esquerda pela segunda vez consecutiva numas legislativas

15 mar, 2024 - 19:48 • Salomé Esteves

Primeiros dados sobre a base social dos eleitores de domingo mostram que a tendência se repete: homens votam mais à direita e mulheres à esquerda.

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As mulheres voltaram a votar mais à esquerda do que os homens nas legislativas de 2024, depois de o terem feito, pela primeira vez, nas eleições de 2022. É o que concluem os primeiros dados da sondagem à boca das urnas conduzida pelo ICS/ULisboa, o ISCTE e a GfK Metris.

Era “preciso esperar para ver” se esse início de diferenciação em termos de género ia, ou não, ser "uma tendência para durar”, disseram Marina Costa Lobo, politóloga, e Paula Espírito Santo, à Renascença, antes das eleições, e falando sobre a possibilidade de as tendências de voto consoante o género se manterem entre as eleições de 2022 e 2024.

Segundo os especialistas Pedro Magalhães e João Cancela, num artigo publicado no Expresso, os primeiros resultados sobre a base sociail dos eleitores “confirmam a adesão de Portugal ao chamado ‘gender gap moderno’ que caracteriza a generalidade das democracias avançadas”.

O termo traduz-se, em português, para “diferença de voto por género” e reflete uma tendência global de as mulheres votarem mais à esquerda e os homens mais à direita. Em países como os Estados Unidos, a Irlanda, Luxemburgo, Espanha, Itália e Finlândia já é hábito isso acontecer desde os anos 1990, mas Portugal tinha-se mantido longe desse padrão.

A tendência mudou em 2022 e, de acordo com estes dados recentes, replicou-se nestas legislativas, nos mesmos moldes.

Segundo os investigadores, os partidos de esquerda, destacando-se o PS, o BE e, em particular, o PAN (partido que não se define nem e esquerda nem de direita), voltaram a receber “desproporcionalmente” mais votos de mulheres do que de homens. À direita, a IL e, principalmente, o Chega, atraíram um voto muito mais masculino.

Esta tendência já se verificava nas sondagens publicadas em 2023. Nos estudos de opinião analisados pela Sondagem das Sondagens, os homens tinham intenções de voto mais à direita do que as mulheres e preferiam os partidos mais conservadores.

Mas, durante o ano, as intenções de voto das potenciais eleitoras não foram tão vincadas entre os partidos de esquerda e de direita, ainda que estejam sempre, e no geral, mais à esquerda do que os homens.

Pedro Magalhães e João Cancela alertam que os mais recentes dados (sobre os eleitores do último domingo) mostram que a diferença de género nos votantes do Chega não é tão acentuada como há dois anos e que o partido cresceu mais entre as eleitoras do que entre o eleitorado masculino.

De facto, as sondagens de 2023 mostram que, também entre as mulheres, o Chega se tornou a terceira força política nas intenções de voto, lugar que antes era disputado entre a Iniciativa Liberal e o Bloco de Esquerda.

Como os dados sobre as bases sociais dos eleitores nestas legislativas ainda são preliminares, é apenas possível aceder a informação sobre os três partidos que receberam mais votos.

Entre as mulheres que votaram, e que têm um curso superior, o voto no PS era tão mais certo quanto mais elevada fosse a idade. A tendência na AD e no Chega é inversa. A diferença é mais acentuada nas mulheres sem curso superior: entre estas, o voto no Partido Socialista quase chega aos 50% na faixa etária acima dos 65 anos.

Ao olhar exclusivamente para a escolaridade, e diluindo as fronteiras do sexo, os investigadores notam que “em Portugal, como noutras paragens”, há “duas esquerdas e duas direitas”.

Se por um lado, PS e CDU tiveram mais votos de eleitores sem cursos superiores, o BE, o Livre e o PAN “invertem o padrão”. À direita, a AD e a IL conseguiram 44% dos votos de todos os diplomados, enquanto, no mesmo grupo, “o Chega não ultrapassou os 11%”.

Nesta lógica, há uma esquerda “velha” (PS e CDU) e uma “nova” (PS, Livre e PAN), da mesma maneira que há uma direta “radical” (Chega) e uma direita moderada (AD e IL). Os investigadores argumentam que o que separa a esquerda “nova” e a direita “moderada” da esquerda “velha” e da direta “radical” é a escolaridade.

Estes dados iniciais também mostram que a AD é relativamente homogénea entre os vários grupos de eleitores e que não se afasta muito, em nenhum deles, no resultado global nacional de 29% dos votos.

Em contraste, os eleitores do PS tendem a ser muito mais velhos, enquanto o apoio na faixa etária dos 18 aos 34 varia entre os 10%, para os homens, e os 15% para as mulheres, independentemente da instrução.

Na faixa etária dos 35 aos 64, os três partidos com melhores resultados nas legislativas de domingo obtiveram percentagens muito semelhantes.

E, se por um lado, mais de 40% dos eleitores com mais de 65 anos sem curso superior preferem o PS, 40% dos jovens dos 18 aos 34, também não-diplomados, votaram no Chega.

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