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Conteúdo político fora do Instagram? É o “triunfo do departamento legal da Meta”

12 fev, 2024 - 23:00 • Daniela Espírito Santo

Mudanças nas plataformas são “medidas preventivas” e servem para “depositar a responsabilidade nas mãos do utilizador”, diz especialista.

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“É o triunfo do departamento legal da Meta”, um “lavar de mãos” que coloca a “responsabilidade no utilizador”. Num ano em que quase metade do planeta vai a eleições, a Meta, responsável pelas plataformas Facebook, WhatsApp, Instagram e Threads, anunciou que vai deixar de recomendar “proactivamente” conteúdo político.

O anúncio foi feito na sexta-feira e vai abranger, inicialmente, o Instagram e o Threads, a que se seguirá o Facebook, pouco depois. A medida, recorde-se, surge numa altura em que Portugal se prepara para mais um processo eleitoral.

Segundo o comunicado da plataforma, temas como a atividade de governos, eleições ou tópicos sociais passam a ter um tratamento diferenciado, sendo que apenas os utilizadores que escolherem, ativamente, obter sugestões relacionadas com conteúdo político o irão receber.

Para Luís Santos, investigador da Universidade do Minho na área da comunicação e sociedade, esta novidade é “o triunfo do departamento legal desse grande gigante que é a Meta”, uma medida tomada depois de “olharem para o calendário”: temos 76 atos eleitorais no planeta só em 2024.

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No fundo, depositam a responsabilidade nas mãos do utilizador

“Sabem melhor que nós como funcionam as suas plataformas e sentem que a pressão regulatória, neste momento, é maior… A atenção que lhes é dedicada, nomeadamente no contexto da União Europeia, é maior”, salienta. Perante o cenário, decidiram tomar “medidas preventivas”.

“No fundo, depositam a responsabilidade nas mãos do utilizador e tentam livrar-se de qualquer situação menos própria que venha a acontecer nos próximos meses nas suas plataformas, em contextos nacionais e internacionais”, admite Luís Santos.

Uma decisão expectável?

A Europa não tem dado tréguas aos gigantes tecnológicos e o próximo ano adivinha-se difícil para quem não cumprir as apertadas regras anunciadas pela União Europeia. Como tal, mudanças radicais do género podem ser esperadas de empresas como a Meta, que tentaram, durante algum tempo, “evitar ser designadas por empresas produtoras de conteúdos”, “sem qualquer responsabilidade” pelo que lá era colocado.

“Essa fase já foi ultrapassada. As entidades reguladoras, nos Estados Unidos e na Europa, forçaram um pouco as plataformas a assumir responsabilidades”, diz Luís Santos, relembrando “situações muito, muito complicadas que aconteceram em períodos eleitorais nalguns países”.

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Proteger o discurso plural não é o negócio principal das plataformas

Na sequência de escândalos como Cambridge Analytica, o que estas empresas fazem agora é “tentar defender-se de mais problemas”. Um “lavar de mãos” expectável de empresas que estão “a tentar proteger o seu negócio”, “muito mais do que a tentar proteger o discurso plural ou o equilíbrio”.

“Esse não é o negócio principal das plataformas. Sabemos disso há muito tempo e parece-me que esta medida reforça essa ideia.”

Mas… de que forma isto pode afetar a campanha eleitoral?

A avaliação só poderá ser feita “à posteriori”, assegura o especialista, pois “não sabemos exatamente quais são as balizas”, ou seja, não sabemos o que é que a Meta entende por conteúdo político.

“Nós ainda não sabemos muito bem o que é que eles vão, de alguma forma, esconder do feed das pessoas, a menos que elas deliberadamente digam 'eu quero este conteúdo'".

“Não sabemos se vai ficar ‘dentro’ apenas o conteúdo publicado, por exemplo, pelas organizações políticas ou se também vai ficar ‘dentro’ conteúdo publicado por empresas jornalísticas ou de pessoas como eu”, diz.

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Teremos uma diminuição da variedade de conteúdos a que vamos ter acesso

Será que vamos deixar de ver notícias sobre política nestas plataformas? Para Luís Santos, esta é só mais uma prova da “relação muito complicada” entre o jornalismo e as redes sociais. “As regras do jogo mudam a meio, os grandes monopólios mais ou menos decidem tudo unilateralmente”, relembra.

“Portanto, fazer depender o meu trabalho jornalístico da presença nas redes sociais parece-me muito pouco prudente nesta altura e acho que ninguém faz isso”.

Voltar atrás não parece ser uma opção, até porque “para o mal ou para o bem, as decisões que estas empresas tomam não merecem grande discussão com terceiros”.

O certo é que teremos, “claramente”, uma “diminuição da variedade de conteúdos a que vamos ter acesso durante este período”.

Como ultrapassar esta medida?

Desta feita, as plataformas, entre as mais utilizadas em Portugal, deixam de “proactivamente recomendar conteúdo político oriundo de contas que não são seguidas” pelo utilizador.

Para “fugir” a esta novidade, o utilizador deve ir às definições de “conteúdo sugerido” e ativamente selecionar “conteúdo político”, opção que está desativada por predefinição.

As alterações devem entrar em vigor nas próximas semanas no Instagram e Threads e, posteriormente, no Facebook. A mudança acontece em plena campanha eleitoral no país, que vai a votos a 10 de março.

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