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​Olga Roriz: “Ter uma companhia independente neste país é obra!”

22 abr, 2020 - 17:24 • Maria João Costa

As celebrações dos 25 anos da Companhia de Dança Olga Roriz foram afetadas pelo estado de emergência. Com o novo espetáculo adiado, à Renascença a coreógrafa fala da resiliência do trabalho da companhia e de como vive o isolamento.

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“Gostaria de celebrar com o público e com uma estreia” os 25 anos da Companhia, confessa a coreógrafa Olga Roriz, mas a pandemia trocou-lhe as voltas. Confinada às paredes de casa e à porta a que chama “fronteira”, a bailarina diz que vivemos um tempo “demasiado sério para se ser criativo”.

Em entrevista à Renascença, que será emitida na sexta-feira à noite, no programa "Ensaio Geral", Olga Roriz fala das bodas de prata da companhia e declara que “ter uma companhia independente neste país, com perseverança e continuidade de trabalho, é obra!”. Sobre o confinamento, Olga Roriz fala numa solidão acompanhada e sobre a paragem dos bailarinos, considera ser “penoso”.

A casa é um local de pensamento para a coreografa. Como é que a Olga Roriz está a viver este momento de confinamento a que a pandemia nos obrigada?

Estou muito dividida, no sentido em que não me está a acontecer nada a mim, mas tudo isto que se passa a nível mundial é extremamente forte. Sentimo-nos numa comunidade que não é só a do nosso bairro, cidade ou país, mas sim humanitária. Por um lado, há algo de tragédia porque isto é um drama; por outro lado, há algo poético (Isto é estranhíssimo dizer e não me levem a mal). É poético porque não me sinto tão sozinha, numa angústia. Sinto que estamos todos no mesmo sítio. Ao sentir isso, é como se estivesse mais acompanhada.

O estar parado é a antítese da vida de um bailarino. Como é que está a viver esta paragem e como vê a situação de milhares de bailarinos pelo mundo?

Coitadinhos dos bailarinos, devem estar loucos, completamente loucos! Tenho pensado imenso neles, os bailarinos de todo o mundo! Este hábito de estar seis horas a trabalhar fisicamente e de trabalhar sobre o espaço e o tempo, neste momento, tudo isso está desarticulado. Estamos confinados a estas paredes, a nossa porta é a nossa fronteira, o inimigo é invisível. Sei que isto é para todos nós, todos temos um corpo, claro, mas a nível da nossa profissão, em que o corpo está extremamente ativo, é penoso.

Deveria estar a celebrar os 25 anos da Companhia com a estreia da peça “Seis Meses Depois”, no Teatro Nacional D.Maria II, em Lisboa, com várias outras iniciativas. Ficou tudo interrompido...

Os 25 anos que se celebram este ano não deixam de acontecer. Claro que gostaria muito de poder celebrar com o público e com esta estreia. A Companhia já não ia ao Teatro D.Maria II, há uitos anos. Seria algo que me faria muito feliz e muito sentido. Esta partilha com o público, a "master class" que iria dar, a apresentação do documentário e de um novo livro de fotografias dos 25 anos da Companhia eram tudo elos de ligação entre o nosso público e a Companhia. Isso não é possível agora, mas não é isso que importa neste momento.

Que balanço faz dos 25 anos de atividade da Companhia de Dança Olga Roriz?

Digo sempre que não gosto muito de balanços, porque tenho a sensação que há um fecho. Toda a minha equipa me exige isso e acho que tem a ver com uma relação com o exterior, o sublinhar estes 25 anos da companhia; mas, na realidade, não é algo circular que se fecha. Acho que a Companhia, e o meu trabalho, sempre foram um continuo. Quero sempre uma descoberta de criação, de uma forma melhor e diferente, de querer encontrar outras coisas. Portanto, não sinto esses ciclos ou fechos. O número 25, são as bodas de prata. Foi um trabalho resiliente. Ter uma companhia independente neste país, com esta perseverança e continuidade de trabalho, acho que é obra!

O momento que atravessamos com esta pandemia é inspirador? Tem conseguido criar?

-Tenho feito algumas coisas criativas, mas não na minha área. Tenho feito colagens, vídeos, tenho escrito bastante! Não me parece que este seja um momento criativo, é um momento de vivermos e sentirmos o que se está a passar. É um momento de reflexão, sobretudo socialmente. Acho que o lado criativo, para mim, irá acontecer quando já me tiver esquecido. Isto vai-se imprimir dentro de mim, vou sentir isto e viver, não me parece que dê, neste momento, grande força criativa. É muito sério o que se está a passar, é demasiado sério para se ser criativo. Depois, vai ser, porque nós vamos sair daqui todos modificados, alguns até transtornados.

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  • A
    23 abr, 2020 C 15:31
    Quando quiser ir embora, nem hesite. Tb não faz falta para a retoma económica

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