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Há 16 anos que o consumo cresce com o Turismo

11 dez, 2023 - 13:00 • Sandra Afonso

Estudo revela que não são as famílias, mas os turistas, os principais responsáveis pelo consumo no país desde 2007. Poder de compra dos portugueses está cada vez mais afastado dos não residentes.

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Entre a crise do suprime e a atual crise inflacionista, o consumo dos não residentes em Portugal cresceu quase duas vezes e meia, aumentou 144,8%. Já o consumo dos residentes subiu apenas 6,8%. Contas feitas, o consumo privado subiu 15,3% entre o 4º trimestre de 2007 e o 2º trimestre de 2023 e os turistas foram responsáveis por 56% desta variação.

São dados avançados no estudo “O contributo do comércio e serviços para a competitividade e a internacionalização da economia portuguesa”, apresentado esta segunda-feira pelo ex ministro da economia, Augusto Mateus.

Este trabalho alerta para a perda de poder de compra dos portugueses, uma “divergência económica persistente” na União Europeia que penaliza os trabalhadores nacionais. Sublinha ainda que as políticas de promoção da economia não podem ignorar estas “disparidades e assimetrias”.

Este estudo, que analisa a evolução económica desde 1995, conclui que as sucessivas crises se traduziram numa prolongada crise de crescimento, visível “primeiro, numa crise de investimento e, depois, numa importante fragmentação económica e social”.

Ou seja, uma sociedade cada vez mais desigual, com “uma multiplicação de modelos diferenciados de trabalho e remuneração, de habitação, consumo e mobilidade, ao nível da população e, também, de uma diferenciação nos interesses e poderes associados ao relacionamento entre residentes e não residentes”.

A economia portuguesa enfrenta agora “desafios muito exigentes”, precisa de reforçar a internacionalização, numa altura em que a economia mundial enfrenta “uma (des)globalização ou uma (re)globalização e se manifestam problemas de estabilização económica e financeira de proporções muito significativas, com dificuldades na regulação dos mercados à escala nacional e internacional”.

É neste contexto que o país tem de desenvolver o mercado interno e “melhorar o poder de compra internacional da população”, para isso precisa de políticas públicas e de iniciativas empresariais que visem a criação de riqueza.

As restrições ao crescimento

A população é um dos entraves ao desenvolvimento do país, segundo este estudo. Podíamos até dizer que o problema de Portugal são os portugueses.

Segundo Augusto Mateus, em causa está “um potencial competitivo ainda limitado pela insuficiente educação e qualificação da população ativa, nomeadamente da menos jovem”.

Apesar dos progressos já alcançados, o envelhecimento da população e a quebra mais expressiva da natalidade deverão agravar esta situação no futuro. São recomendadas reformas da oferta educativa, que concretizem a aprendizagem ao longo da vida.

Ainda no ensino, este trabalho alerta para “a permanência de um longo divórcio entre a oferta e procura dos serviços educativos”, diz que famílias, empresas e Estado andam desencontrados na identificação das necessidades e oportunidades na educação. É urgente que colaborem.

Outra restrição surge com o envelhecimento e redução da população, que gera fluxos migratórios. Assistimos ao aumento da saída de jovens qualificados, enquanto entram no país reformados de países desenvolvidos e pessoas ativas de países emergentes, para trabalhar em atividades intensivas e menos qualificadas.

De acordo com o estudo, estes movimentos demográficos “questionam a coesão económica, social e territorial” e exigem novos modelos de gestão autárquica.

Por último, é criticada a pouca abertura da economia nacional, que deve estar mais articulada com as redes ibéricas, europeias e mundiais. A internacionalização não passa apenas pela mobilidade e logística de pessoas e bens, envolve também conhecimento, cultura e informação.

Augusto Mateus defende que é preciso “mais mundo em Portugal” e “mais Portugal no Mundo”, com oportunidades equilibradas de internacionalização.

Recomendações

De acordo com este estudo, Portugal precisa de uma convergência económica real com a União Europeia. Para lá chegar, não basta apontar para o crescimento e para a produtividade, são necessárias “melhorias sustentadas na remuneração dos fatores de produção de riqueza”.

É ainda essencial “incentivar e viabilizar o bom investimento público e privado”, o que passa também por “aliviar as restrições financeiras” e incentivar a colaboração entre as duas partes. Este trabalho denuncia que em Portugal os serviços públicos funcionam em “circuito fechado”, limitando o acesso da população e agravando as dificuldades na gestão das contas públicas.

Este trabalho, assinado por Augusto Mateus, diz que “os grandes desafios elencados parecem exigir, ainda em Portugal, uma eficácia também bastante aumentada na formulação e condução das políticas públicas”. No entanto, “parece existir na sociedade portuguesa um razoável consenso sobre a persistência de um défice de racionalidade e continuidade nas políticas públicas com relevância económica”, acrescenta. Esta situação “tende a penalizar o nível de investimento, a capacidade competitiva das empresas e a qualidade estratégica da regulação dos mercados”.

Não são aconselhadas “políticas genéricas” nem “políticas discricionárias, oscilatórias e meramente reativas”.

O estudo defende também que o comércio e os serviços, pela sua dimensão, merecem uma atenção específica, devem ser olhados como um “instrumento muito relevante de melhoria sustentada da competitividade da economia portuguesa”.

Defende-se ainda a “reorientação da economia portuguesa para fora”, com melos conteúdo importado nas exportações e mais aposta na inovação.

Quatro prioridades

A abertura da economia ao exterior impõe a correção de desequilíbrios, alguns deles rapidamente:

  • A valorização e requalificação do turismo, com o desenvolvimento de ofertas distintivas, que promovam um maior poder de compra;
  • Reposicionamento de Portugal nas cadeias de valor globais, com mais presença em todo o processo, aposta na inovação e captação de investimento direto estrangeiro;
  • Reposicionamento nas plataformas de concorrência e cooperação digitais e não digitais, com mais investimento e maior aposta em projetos com mais valor acrescentado.
  • Reapreciação do papel do comércio, enquanto prestador de serviços.
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