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Redes sociais e eleições. A tempestade perfeita que pode derrubar a democracia

28 fev, 2024 - 11:30 • Daniela Espírito Santo

Metade do planeta vai a votos este ano, numa altura em que as gigantes tecnológicas despediram centenas de trabalhadores. Estamos a criar uma tempestade perfeita?

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As cinco maiores empresas de tecnologia do planeta bateram recordes de lucro o ano passado, mas começaram 2024 com despedimentos.

Os números, citados neste artigo pelo Correio da Manhã, não deixam espaço para dúvidas: os lucros das gigantes tecnológicas Alphabet (Google, Youtube), Microsoft (LinkedIn) e Meta (Facebook, Instagram, Threads e WhatsApp) ultrapassaram em 2023 os valores atingidos em 2021. A Microsoft amealhou 76,9 mil milhões de euros, a Alphabet 68,4 mil milhões e a Meta 36,1 mil milhões.

Apesar disso, todas despediram centenas de funcionários este ano, o que pode afetar a forma como vão encarar as dezenas de eleições que se realizam este ano um pouco por todo o planeta.

Para Alberto Fernandez Hibachi, da organização intergovernamental International Idea, que apoia e promove a democracia por todo o mundo - Portugal incluído -, podemos estar a criar a "tempestade perfeita" nas redes sociais, que pode contribuir para ameaça que paira sob a democracia global.

"As plataformas não ganham nada em ser o centro da polémica numa eleição. Por isso, quando eles têm recursos, tempo e pessoas, eles garantem que as coisas são feitas da maneira correta. O problema é que muitas das pessoas dos departamentos que tratavam das eleições nestas empresas foram demitidas. Algumas companhias como o X [antigo Twitter] dispensaram toda a gente que tratava destes assuntos e agora a capacidade de resposta é pequena. Estamos prestes a ver as consequências disso", assegura.

Ainda é cedo para perceber, mas as consequências podem estar aí à porta. "Não temos ainda dados porque esta onda de despedimentos é muito recente e nunca tivemos este número de eleições seguidas. Vamos ver o que acontece quando tiverem de enfrentar cinco grandes eleições no mesmo mês. Pode ser a tempestade perfeita..."

"Vamos ter milhares de milhões de pessoas a votar em 2024", relembra, à Renascença, o responsável pelo programa de digitalização da Internacional Idea. É, por isso, mais importante que nunca garantir que a democracia não sucumbe à erosão, que vai além do processo eleitoral.

"Acho que a qualidade da democracia está a decrescer na Europa porque está a decrescer em todo o lado. Não está a acontecer em todos os países, mas vemos tendências que preocupam", desabafa.

Neste cenário, as redes sociais não são o maior problema. "O verdadeiro perigo para a democracia são as lideranças não liberais. O perigo está nas lideranças e partidos políticos que colocam o poder acima das normas democráticas", salienta o especialista. O desafio passa, contudo, pela utilização que estes líderes possam fazer das plataformas sociais.

"Sabemos que este tipo de lideranças tende a usar as redes sociais como armas", diz o representante da International Idea, que tem analisado vários processos eleitorais e deixado recomendações para governos e plataformas. Mesmo assim, o principal enfoque dos populismos continua a estar nos meios tradicionais. "Focamo-nos nas redes mas o problema é quando estas narrativas saem das plataformas e vão para os meios tradicionais. Quando saem dos cantos obscuros da Internet e entram no 'mainstream' é que se tornam perigosas", reforça.

Neste contexto as eleições em Portugal não são particularmente preocupantes para a A International Idea. Alberto Fernandez Hibachi acredita que o "sistema eleitoral português é robusto" e as nossas eleições "são perfeitamente limpas, livres e justas".

"O processo eleitoral não é um problema em Portugal. O que me preocupa - e não é só em Portugal - é a perceção que as pessoas possam ter da integridade das eleições", reforça.

Próximo problema? "Deep fakes", mas isso talvez fique para outras núpcias... Este ano o teste é mais "filosófico" e envolve garantir que mantemos a integridade da democracia. "É legítimo questionar as constituições e o sistema eleitoral, tudo isso pode ser mudado, mas não há nada que justifique não seguir as regras democráticas para ganhar poder", relembra.

No final de todas as contas, há, para Alberto, eleições mais complexas, como as norte-americanas, indianas e paquistanesas, mas todas as eleições são importantes este ano, que representa um "virar de ciclo". Este é, por isso, o ano em que vamos ver se "a democracia passa o teste" e em que estado segue viagem para 2025.

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  • Anastácio José Marti
    28 fev, 2024 Lisboa 12:08
    Será por acaso ou foram os comportamentos e decisões dos políticos que raramente tiveram em conta os interesses da população e do planeta que nos trouxeram a este descrédito nos mesmos? Teria bastado mais respeito pelos cidadãos e pelos seus legítimos direitos do que o que houve, mas agora que o mal já está feito e durante tempo demasiado com marcas inequívocas na população, na sua suposta qualidade de vida, na sua saúde e na sua realização profissional que foi igualmente afetada, seja dada a palavra ao povo, para que saibamos todos em quanto irá ficar a abstenção, quantos votos em branco existirão, para que se saiba o estado de saúde da democracia, a exemplo do que aconteceu nos Açores onde mais de metade da população não votou o que deveria ter sido um sinal para os políticos que fingiram não ver e terão em 10/3/2024, a resposta que há muito merecem do povo.

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