Entrevista Renascença

Bruno Vicintin: "Não viemos para a SAD do Santa Clara para ficar apenas um ou dois anos"

28 set, 2022 - 10:30 • Carlos Dias

Em entrevista a Bola Branca, o novo acionista maioritário da SAD do Santa Clara aposta num projeto sustentado, de vários anos, mesmo que haja descida de divisão esta época. Bruno Vicintin traça como objetivo futuro a Europa e elogia Mário Silva.

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Bruno Vicintin, o novo acionista maioritário da SAD do Santa Clara, promete aposta forte, mesmo que a equipa desça de divisão naquele que chama de ano zero.

A aposta é num projeto sustentado, que tem como objetivo o regresso às competições europeias. Já a luta pelo título só será possível depois da centralização dos direitos televisivos.

"Só vamos chegar lá com mudanças estruturais no futebol português, porque há uma grande diferença de orçamentos entre as grandes equipas e as restantes", sustenta, em entrevista a Bola Branca.

O dirigente, que foi campeão brasileiro pelo Cruzeiro e entrou na SAD do Santa Clara, em julho, elogia o treinador Mário Silva e agradece a forma como foi recebido nos Açores. Sobre a Liga portuguesa, deixa reparos à arbitragem, apelando ao contributo de todos os intervenientes para que possa melhorar.

Assumiu o controlo da SAD do Santa Clara a meio de julho. Qual o seu objetivo para este trabalho. Que sonho tem para este seu projeto no futebol português?

Nós sonhamos em grande, sonhamos em representar os Açores, representar o povo açoriano que é um povo trabalhador, hospitaleiro e que tem muito orgulho de ser português. É muito importante para ele ter o Santa Clara na I Liga.

Como dirigente fui campeão brasileiro, venci a Copa do Brasil, são títulos muito difíceis. É obvio que sonho em ser campeão, chegar às competições europeias. Às provas da UEFA penso que vamos conseguir voltar. Já quanto à luta por um título, só vamos chegar lá com mudanças estruturais no futebol português, porque há uma grande diferença de orçamentos entre as grandes equipas e as restantes.

Fala-se muito da necessidade de avançar a centralização dos direitos televisivos, permitindo uma distribuição mais equilibrada das verbas pelos clubes. O governo definiu o ano de 2028 como data-limite para essa distribuição. Não faltará demasiado tempo?

Concordo. Quanto mais cedo tivermos uma divisão mais democrática do dinheiro dos direitos televisivos, mais forte ficará a Liga portuguesa. Não tenho dúvidas, porque foi assim com todos os países que seguiram esta via.

O Santa Clara está muito perto da zona de descida de divisão, com cinco pontos conquistados em sete jornadas. Uma eventual descida de divisão será motivo para abdicar deste projeto?

Acredito na manutenção, acredito que temos um projeto vencedor. Não vim para os Açores para ficar apenas um ou dois anos.

Mesmo que esta época corra mal e a equipa desça de divisão?

Sem dúvida, acredito no projeto. Sabia das dificuldades, até porque nós não herdamos aquela equipa que foi às competições europeias, que fez excelentes resultados no campeonato. Ela ficou praticamente desfeita, foram vendidos muitos jogadores. Nós assumimos a SAD faltavam praticamente duas semanas para contratar jogadores e tivemos de montar um plantel quase do zero. Estamos convencidos de que a equipa tem muita qualidade, agora esta equipa precisa de jogos, ou seja, o nosso problema é que vamos ter de “concertar o carro andando”.

Mário Silva é o treinador, qual a opinião que tem do seu trabalho?

Estou muito impressionado com o Mário Silva, não tenho dúvidas de que, em breve, será mais um treinador a ter sucesso ao nível mundial. Estou impressionado e já trabalhei com vários treinadores de nível de seleção brasileira. O Mário Silva sabe muto de futebol e acredito que estamos em boas mãos e os resultados vão aparecer com a sequência do trabalho e esta equipa a ganhar minutos em jogo. Acreditamos muito no trabalho do Mário Silva.

O Santa Clara já mostrou algum incómodo com as arbitragens. Quais são as queixas em concreto?

O que está a incomodar muito o Santa Clara é que não entende os critérios que são seguidos pela arbitragem. A bola na mão num jogo é grande penalidade, mas nesse mesmo jogo, mais à frente, já não é. Penso que este é o maior problema que existe hoje na arbitragem portuguesa.

Por exemplo, no nosso jogo com o Casa Pia, a bola bate no braço de um dos nossos jogadores, quando ele estava de costas para a bola. O VAR chamou o árbitro, que assinalou penálti, mas, depois, tivemos os jogos com o Famalicão e o Vitória de Guimarães, onde a bola bate na mão do adversário, que está de frente para a bola e com o braço estendido, e o VAR não chama o árbitro.

Penso que este é um tema que tem de ser trabalhado, mas atenção, a arbitragem portuguesa só vai melhorar com a ajuda de todos. A arbitragem é uma das áreas onde o futebol português tem de melhorar. Penso que nós, e já falo com estando incluído no futebol português, temos de ter mais árbitros com nível elevado, como já aconteceu no passado.

Assim que chegou, apostou na contratação de muitos jogadores do seu país de origem. Teme que seja acusado de fazer desta equipa um entreposto de futebolistas brasileiros?

Os dois mercados que conheço melhor são o brasileiro e o português. As boas oportunidades em Portugal, os melhores jogadores da II Liga, já não estavam disponíveis, por isso, tivemos de ser muito agressivos no mercado brasileiro. Mas este é um projeto mundial, não é um projeto de promoção do jogador brasileiro na Europa.

Pelo meu histórico, será natural que o Santa Clara tenha força no mercado brasileiro, mas queremos uma equipa com jogadores de vários países que tenha capacidade para lutar pelas posições mais altas do campeonato.

Financeiramente teve alguma surpresa negativa quando assumiu o comando da SAD do Santa Clara?

Não tive, já estava à espera do que acabei por encontrar. Estamos a conseguir colocar em dia os vários processos que estavam pendentes. O Santa Clara tem um nível de receitas muito baixo, mas já renegociamos uma divida ao Athletico Paranaense que já estava na FIFA, por causa da transferência do Cryzan.

Aproveito para agradecer a disponibilidade do meu amigo, Mário Petraglia, presidente do Athletico. Esta era uma dívida que preocupava muito o Santa Clara e os seus adeptos, porque podia criar penalizações graves. Também acertamos uma dívida que tínhamos com o Banco Santander, que há muitos anos bloqueava as receitas do clube. Aos poucos, vamos colocando a casa em ordem.

Com tem sido a relação com o Santa Clara-clube, que tem uma posição minoritária na SAD?

A relação com o presidente Ricardo Pacheco tem sido fenomenal, fui muito bem recebido nos Açores. Até fiquei surpreendido, porque é normal haver uma desconfiança quando chega uma pessoa nova, ainda por cima de outro país. O povo açoriano recebeu-me muito bem, é um povo muito hospitaleiro. No Conselho de Administração, o representante do clube é o seu presidente

Foi dirigente no Brasil, teve sucesso no Cruzeiro. Qual a sua opinião sobre a contratação de vários técnicos portugueses para trabalhar no futebol brasileiro?

Fui eu, enquanto vice-presidente do Cruzeiro, que levei o Paulo Bento para o Brasil. Eu sempre achei que, da mesma forma que o jogador brasileiro tem condições para adaptar-se rapidamente ao futebol aqui em Portugal, o treinador português teria uma facilidade muito grande de adaptação ao campeonato brasileiro. Pelas mesmas razões, clima, língua, comida.

Considero que Portugal está muito avançado na vertente tática e isso ajuda muito o desempenho dos treinadores portugueses no Brasil. Taticamente os treinadores brasileiros não estavam tão avançados. Já tecnicamente o Brasil continua a ter jogadores muito evoluídos. Assim, juntando o melhor dos dois mundos, temos o sucesso de treinadores como o Abel Ferreira e o Jorge Jesus, mas é natural que outros técnicos portugueses não tenham sucesso, faz parte do futebol.

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