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Se as regiões do Centro e de Lisboa e Vale do Tejo estivessem tão bem organizadas como a região Norte poderiam ter-se evitado até 4.300 mortes na terceira vaga da pandemia, considera o professor Carlos Antunes, investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

O investigador admite que as conclusões são especulativas, mas baseiam-se em factos indesmentíveis. “O que os dados mostram é que as regiões Centro e Lisboa e Vale do Tejo, juntas, somaram na terceira vaga, mais 4.300 óbitos relativamente à sua segunda vaga. Comparando com a região Norte observamos que o Norte teve menos 270 óbitos na terceira vaga relativamente à segunda”, explica.

“Pensamos que o motivo pode ter a ver com a organização e atuação da saúde pública no terreno, ou seja, ter mais meios de rastreio epidemiológico, ter mais capacidade de testagem, fazer mais testes por método, pode reduzir a transmissibilidade. Deduzimos que houve mais meios a norte, melhor organização no terreno, melhor atuação da saúde pública no terreno, que impediu o aumento da incidência e, dessa forma, reduziu a possibilidade de mais óbitos, já que a taxa de letalidade são 2% da incidência, ou seja, quanto maior for a incidência, mais óbitos há. Ora, controlando a incidência a montante, através de medidas de saúde pública no terreno, eu posso evitar um maior número de óbitos."

Resumindo, a equipa de Carlos Antunes acredita que os serviços a norte aprenderam a lição da primeira e da segunda vaga. “É isso que pensamos que poderá ter ocorrido na região Norte, com a experiência da primeira vaga, acumulada com a experiência da segunda, uma perceção de que se deve atuar em primeira linha através da saúde pública no terreno, com medidas de reforço do rastreamento epidemiológico e de maior e melhor testagem por forma a isolar mais precocemente os novos infetados e impedir que novas cadeias de transmissão se processem.”

O professor e investigador admite não saber por que razão foi possível coexistirem em Portugal dois sistemas. “Isso já me transcende um pouco, eu não estou dentro do SNS e dentro da organização das suas subdivisões, mas penso que é uma questão cultural e institucional e talvez uma falha na perceção das instituições locais, sobre o real problema e uma incapacidade de atuação.”

Questionado sobre se o assunto merece um apuramento de responsabilidades, Carlos Antunes rejeita a ideia e diz que importante mesmo é não deixar cair as lições no esquecimento.

“Não quero entrar por essa via, porque eu estou a fazer essa leitura depois do jogo terminar, não é? Nós temos é de aprender com os erros, por isso cada vez que passamos por uma situação dessas devemos aprender e melhorar os nossos mecanismos e os nossos sistemas por forma a, nas próximas situações, evitarmos precisamente este insucesso no evitar de mais vítimas”, conclui.