"O que se passou com as provas do 12º ano foi um regabofe"
21-05-2021 - 00:50
 • Eunice Lourenço (Renascença) e Ana Sá Lopes (Público)

Ex-ministro da Educação defende publicação dos rankings, mas rejeita “leituras simplistas” e pede mais meios de diagnóstico.

O ex-ministro da Educação David Justino aconselha cuidados especiais nas leituras e interpretações dos rankings deste ano. Justino, que é professor catedrático de Sociologia, rejeita “leituras simplistas” de tabelas classificativas.

“Só vejo tabelas classificativas para saber onde está o meu clube de futebol, mais nada. Os rankings a mim não me esclarecem tanto como a tabela classificativa que posso ler no ‘Record’ ou na ‘Bola’”, diz o ex-ministro e atual vice-presidente do PSD em entrevista à Renascença e ao Público.

Ainda assim, defende a publicação dos rankings pelo “direito que as pessoas têm poder aceder à informação”. “Aquilo que vão fazer com a informação a que têm acesso é uma coisa completamente diferente”, avisa.

“O Governo tem obrigação de publicar esses resultados ainda que aquilo que se passou no ano passado relativamente às provas designadamente do 12º ano, desculpem-me o termo mais vernáculo, foi um regabofe”, afirma, referindo-se à alteração de regras e de critérios para estas provas devido à situação de pandemia.

Por um lado, só foram fazer exame os alunos que precisavam das notas de cada disciplina para efeitos de ingresso no ensino superior. Por outro lado, os critérios de avaliação também mudaram.

“Parte-se do princípio que as notas são comparáveis quando são usados os mesmos critérios. Se os critérios de avaliação e de ponderação são diferentes elas deixam de ser compráveis e, portanto, tem de se ter o máximo cuidado com as conclusões que se retiram”, pede Justino, reafirmando que isso não é razão para deixar de serem públicos os dados dos exames.

“Há muita maneira de ler os rankings e eu não me limito às leituras imediatas de quem está em primeiro e de quem está em segundo. Geralmente, trabalho isso com as minas equipas para fazer relações entre contexto social, como é que professores com a mesma origem social têm resultados diferentes, como é que escolas com o mesmo tipo de professores têm resultados diferentes, é isso que me interessa saber. Ou seja, aprender com os rankings para melhorar. Os rankings permitem isso se não se fizer uma leitura ligeira”, acrescenta o ex-ministro.

PSD vai apresentar contributos para plano de recuperação de aprendizagens

O PSD, avança Justino, vai apresentar um projeto de resolução sobre o plano para a recuperação de aprendizagens prometido pelo Governo e já em atraso. “Sabemos que o Governo está a preparar um plano que devia ter apresentado e ainda não o fez. Face ao atraso, o que estamos a fazer - em vez de estarmos aqui a carregar no Governo – é ajudar o Governo e dar vários contributos para que eles possam incorporar isso no plano”, anuncia o dirigente social-democrata, que não tem problemas em colaborar com o executivo, apesar de o criticar.

“A educação não dá para brincar às oposições e não me choca nada que me chamem de colaboracionista, porque acho que é esta colaboração que o país precisa”, justifica.

David Justino, contudo, lamenta que não existam meios de diagnóstico suficientes para saber que plano é que é necessário.

“Quando falamos do plano de recuperação de aprendizagens as perguntas que faço é: quanto é que se perdeu? O que é que s perdeu? em que disciplinas? em que anos? são coisas diferentes. Se eu perder aprendizagens nos dois primeiros anos de escolaridade em que os miúdos têm como finalidade abarcar os códigos fundamentais da aprendizagem: a leitura, a escrita, o cálculo, etc. Isso vai acompanhá-los durante o resto do trajeto todo. Ou seja, deficiências aí são muito mais graves do que deficiências por exemplo no 9º ano. Não é tudo igual”, explica.

“O que preciso é de ter instrumentos d diagnóstico que sejam credíveis, rigorosos, mas não temos porque anterior governo - mas a equipa é a mesma - acabou com os exames, as provas de aferição deixaram de ter utilidade …”, lamenta.

Também faltam instrumentos, segundo o ex-ministro, para perceber de que fala quando a presidente do Conselho Nacional de Educação diz que há 20 mil alunos que desapareceram do radar das escolas.

“O que pode acontecer é que há avarias no radar. Se desapareceram do radar 20 mil alunos quero saber se desapareceram mesmo ou se a avaria está no radar porque não tenho instrumentos que me possam monitorizar o desempenho dos alunos ou se desistiram ou abandonaram ou interromperam. Não há instrumentos objetivos e a curtíssimo prazo que me permitam fazer esse diagnóstico”, diz o ex-ministro da Educação.

“É a mesma cosia que um médico que quer fazer o diagnóstico do doente e pega no termómetro e o manda pela janela fora. A radiografia? Não é preciso para nada. E, depois, olha para o doente e diz "está com mau aspeto". Mas não sabe porquê. Não gosto de trabalhar assim. Gosto de trabalhar com bons diagnósticos porque só um bom diagnóstico é que vai permitir dizer quais são as medidas mais aconselháveis e mais adequadas para responder a determinado tipo de problemas. Se não sei qual a dimensão do problema o que é que posso fazer? Retórica”, conclui David Justino.