O "Movimento de Cidadania" nascido na Covilhã para matar a fome e que já apoia mil pessoas
15-11-2020 - 09:10
 • Liliana Carona (texto e fotos)

A Refood e as Conferências São Vicente de Paulo uniram esforços para criar o "Movimento de Cidadania" na Covilhã, uma iniciativa solidária que arrancou no primeiro Estado de Emergência e que apoia neste momento 378 famílias com um cabaz de alimentos por mês e jantares diários. O movimento já chegou à Escola Secundária Quinta das Palmeiras.

Numa organização meticulosa, Maria Odete, 75 anos, vicentina há mais de 30, distribui os alimentos que 378 famílias hão de ir buscar às instalações da Refood na Covilhã. A pandemia de Covid-19 passou a implicar uma nova dinâmica que aumento as dificuldades entre as pessoas e que "impossibilitou o ADN" do movimento católico ‘As Conferências de S. Vicente de Paulo’.

“Todos nós, os vicentinos, somos pessoas de risco, com idade avançada e é difícil continuar com o nosso ADN, visitarmos as pessoas, olharmos as pessoas olhos nos olhos”, declara Maria Odete à Renascença, salientando que “é completamente diferente estarmos aqui ou irmos a casa deles, estar com eles, chorar com eles”.

Nos últimos meses “não tem sido fácil, mas esta foi a única solução, e cada vez são mais os pedidos e de muita urgência”, refere Maria Odete, repetindo que esta é uma situação temporária para o movimento católico que vive dos sócios e das doações.

“Ser vicentina é ter disponibilidade total para ajudar os outros”, destaca sobre uma parceria que também tem tido o apoio do município da Covilhã, mas é na Refood, um movimento que encaminha os desperdícios alimentares para quem mais precisa, que nasceu o ‘Movimento de Cidadania’.

Maria da Luz, 60 anos, coordenadora da Refood da Covilhã, organiza quatro rotas diárias, por 40 estabelecimentos que doam os excedentes, para que diariamente, as mais de 370 famílias, num total de mil pessoas, recebam o jantar.

“Tentamos dar uma refeição diária, mas claro que se tivéssemos mais comida dávamos mais. Percorremos 40 fontes de alimentos -- restaurantes, padarias, pastelarias, cafés, hipermercados -- e trazemos o que sobra e guardamos no frio. Depois dividimos consoante o agregado familiar”, explica sobre o processo de recolha e ajuda alimentar que depende de voluntários e voluntárias, como Marta Alçada, de 46 anos, que já está a pensar na noite de consoada.

Nas instalações da Refood da Covilhã, ela que também já foi coordenadora daquele movimento faz telefonemas para conseguir bolos rei para todas as 378 famílias. Todavia, Marta denota cada vez mais dificuldades nas empresas a quem pede auxílio.

“Temos menos excedentes, as empresas têm menos excedentes e estamos a chegar ao nosso limite”, revela, justificando o propósito do ‘Movimento de Cidadania’. Por isso é que nasceu o ‘Movimento de Cidadania’, unirmo-nos às conferências vicentinas, apoiando-nos mutuamente, eles não podiam sair e nós não tínhamos alimentos suficientes, até porque o número das famílias a precisar vai aumentar substancialmente”, conta Marta Alçada.

No dia em que receberam a Renascença, duas carrinhas paravam à frente das instalações da Refood. “Tivemos duas visitas, uma do Banco Alimentar que ajuda mensalmente as conferências de S. Vicente de Paulo e outra de uma empresa imobiliária, a DBJ, que nos ofereceu 1.000€ em alimentos”, enaltece.

O ‘Movimento de Cidadania’ chegou entretanto à Escola Secundária Quinta das Palmeiras, no âmbito da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. Carlota Bom Jesus, 17 anos, no 12.º ano, que sonha seguir enfermagem, está a recolher alimentos.

“Mal soube da iniciativa fui logo fazer o logótipo. Já começámos o projeto de recolha de alimentos na escola e há muita gente a participar, principalmente professores, gostava que os jovens aderissem mais”, partilha a jovem estudante.

O projeto da recolha de alimentos nasceu da vontade de um grupo de seis alunos de 11.º ano, no início da pandemia, no âmbito da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento que foi implementada este ano.

Carlota gostava que os jovens participassem mais e a vicentina Maria Odete gostava que mais ninguém precisasse de ajuda. “Que a ajuda das Conferências acabasse, que não fosse mais precisa, era sinal que todas as pessoas estavam bem”, sorri, em sinal de esperança.