"Gestão da pandemia em Portugal foi desastrosa porque se esqueceram todas as outras doenças"
15-01-2024 - 10:21
 • Sérgio Costa , Marta Pedreira Mixão

Está confirmado o impacto negativo da pandemia de covid-19 na prestação de cuidados do cancro em 2020, segundo o Registo Oncológico Nacional. Para Henrique Raposo, comentador d'As Três da Manhã, esta realidade é retratada no "excesso de mortalidade gigantesco que nós temos em Portugal, em 2022 foram quinze mil pessoas a mais do que o previsto que morreram".

Está confirmado o impacto negativo da pandemia de covid-19 na prestação de cuidados do cancro em 2020, segundo o Registo Oncológico Nacional.

As previsões para 2020 - ano fortemente marcado pela pandemia - apontavam para 60.000 a 65.000 o número de novos casos de cancro, tendo sido registados 52.723, menos 9% o que em 2019, e uma diferença de 15 a 24% em relação ao previsto.

Para Henrique Raposo, comentador d'As Três da Manhã, esta realidade é retratada no "excesso de mortalidade gigantesco que nós temos em Portugal, em 2022 foram quinze mil pessoas a mais do que o previsto que morreram"

"Este janeiro está a ser um desastre, só é superado pelo janeiro da pandemia, de 2021. As infeções respiratórias não explicam por que é que pessoas de quarenta anos, cinquenta, estão a morrer tanto, muito acima do do normal. Têm de ser outras doenças", afirma.

Maria José Bento, diretora do serviço de Epidemiologia do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto, mostrou-se preocupada com os atrasos no diagnóstico e no tratamento, algo que, disse, "deverá ter expressão nos dados de 2021 ou 2022, traduzindo-se em mais morbilidade e mortalidade" por cancro, apontando a culpa à "interrupção dos rastreios".

Por isso mesmo, Henrique Raposo relembra que, "durante a pandemia, tiveste todos os especialistas - oncologia, nefrologia, cardiologia, psiquiatria - a avisar que se vamos concentrar a medicina numa única doença, as outras vão ficar à nossa espera e vão avançar, vão desenvolver-se, não vai haver diagnóstico e tratamento, não vai haver operações e vão rebentar na nossa cara. E estão a rebentar em número de mortos, que é gigantesco, e há pessoas que chegam com cancros avançadíssimos".

Perante estas conclusões, o comentador considera que a "gestão da pandemia em Portugal foi desastrosa, porque se esqueceram todas as outras doenças".

"Seguimos a China, a maior ditadura do mundo, seguimos aquele exemplo durante uns dois anos, sem questionar. Fazer perguntas era ser negacionista e ao mesmo tempo diabolizamos a democracia mais avançada e que, sistematicamente, é mais exemplar em todos os sítios, em todos os parâmetros: a Suécia. Foi um momento esquizofrénico estranhíssimo. Como é que nós, de repente passámos a diabolizar a democracia que toda a gente quer imitar?", questiona.
Henrique Raposo defende ainda que a Suécia tem "as melhores políticas públicas, as mais racionais, as mais baseadas em fatos" e considera que "fazem tiros mais precisos", mas que Portugal optou por seguir o "modelo de arrasto da China".

Para o comentador, é importante "refletir sobre os erros que foram cometidos" porque afirma que "vamos ter novamente pandemias" e a "globalização não vai parar".

Raposo critica também o caso de crianças com necessidades educativas especiais, considerando que foram "arrasados", por terem visto as suas necessidades sem resposta durante dois anos.

"Tens novamente uma questão: a saúde mental, que foi arrasada pelo o 'fofinho' ficar em casa", acusa.

Sobre o facto de a saúde mental continuar a ser esquecida nos discursos dos diferentes partidos, à porta de eleições, Henrique Raposo considera que é algo "desastroso".

"Temos problemas gravíssimos até na juventude. Temos indicadores de depressão, ansiedade e suicídio. Até nos jovens, até nas miúdas que historicamente estavam afastadas dessas questões do suicídio e ninguém tem uma resposta para isso. As escolas não têm, os hospitais não têm", conclui.

Há cerca de 20 mil doentes à espera de uma consulta de saúde mental e que cerca de metade dos casos prioritários (1.600) esperam mais do que o tempo previsto na lei (60 dias), segundo um estudo realizado pela Entidade Reguladora da Saúde.