IPDJ considera que Mourinho deu "mau exemplo" aos jovens ao confrontar árbitro
07-06-2023 - 20:02
 • Beatriz Lopes

Presidente do IPDJ acredita que as novas gerações vão contribuir para mudança de comportamentos e, no futuro, "Portugal não vai precisar de polícias nos estádios". Vítor Pataco quer desafiar os portugueses a serem mais ativos e acredita que será possível alcançar a paridade no número de homens e mulheres a praticar desporto federado.

“Os comportamentos de treinadores de referência como o de José Mourinho são inaceitáveis”, afirma Vítor Pataco, presidente do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), em entrevista ao podcast Geração Z da Renascença, que esta semana debate a relação dos jovens com o desporto.

As declarações surgem numa altura em que José Mourinho está debaixo de fogo e a ser alvo de um processo disciplinar por parte da UEFA, por "insultos e linguagem abusiva" dirigida ao árbitro no final da Liga Europa perdida para o Sevilha. Vítor Pataco fala num "mau exemplo" para as gerações mais novas que já "encaram a prática desportiva de uma forma mais positiva".

"Não podemos de maneira nenhuma aceitar um comportamento desviante como aquele que vimos. Sou um admirador de José Mourinho desde sempre, mas como português senti-me muito constrangido ao ver aquele comportamento e vimos que ele teve uma relação direta e contagiou o comportamento dos adeptos no aeroporto”, critica.

Em relação à violência nos campos de futebol, o presidente do IPDJ acredita que chegará o dia em que Portugal não vai precisar de polícias nos estádios e aplaudir o adversário “será normal”. Portugal ainda não é a Inglaterra, reconhece, mas “está também a fazer o seu caminho”- que não deveria passar pelo aumento de penalizações, mas sim "pela componente educacional".

"Eu acredito na progressão daquilo que é uma evolução social baseada na educação e baseada nos valores. (...) Agora, se nem um treinador que conduz uma equipa de jovens tem valores, e não consegue transmitir esses valores, esses jovens não vão ter valores para a vida. E é por isso que também é muito importante a formação e qualificação dos treinadores e a preservação daquilo que são os valores intrínsecos do desporto. Muitas vezes o treinador tem um papel mais influente do que os próprios pais", alerta.

Não são os jovens que precisam de lições de desportivismo, mas os pais

"As novas gerações já encaram a prática desportiva de uma forma bastante mais positiva", acredita o presidente do Instituto Português do Desporto e Juventude, que admite que até podem ser os jovens a "reeducar" os pais.

"A nova geração encontra na sociedade outras inspirações e outras motivações até de mudança. Por exemplo, as questões ambientais a que os nossos pais não eram sensíveis, hoje, como bem sabemos, os jovens são sensíveis a elas e são eles que reeducam os pais. No desporto é a mesma coisa. Portanto, nós não temos que nos preocupar com os jovens, mas sim com quem está à sua volta, incluindo os próprios pais", alerta.

Foi com esse objetivo que o Instituto Português do Desporto e Juventude lançou, em maio, em parceria com outras federações [Futebol, Andebol, Basquetebol, Voleibol e Patinagem], a campanha #NãoSejaBullydeBancada. A iniciativa quer erradicar comportamentos poucos éticos e violentos dos pais e encarregados de educação no desporto que, de acordo com Vítor Pataco, chegam a causar "constrangimento aos próprios filhos, sobrinhos, netos".

"Chamar nomes aos árbitros, aos treinadores ou aos próprios colegas.... As crianças e os jovens não gostam disso. (...) Os pais devem incentivar os filhos de forma positiva, para que se sintam mais tranquilos e motivados para a prática desportiva e não estarem ali sob pressão por parte dos familiares", sublinha.

Vítor Pataco recorre ao "bom exemplo" do andebol de praia para lembrar o que deveria ser uma prática normal num contexto de competição.

"Nos penalties, quando um jogador marca golo, vai dar um abraço de solidariedade ao guarda-redes. É um gesto que é apreciado nas bancadas, bastante simpático e de muito desportivismo"


Atingir igualdade de género no desporto? "Ambicioso, mas alcançável"

Em dez anos, entre 2010 a 2020, Portugal ganhou 35.270 atletas mulheres, um aumento superior ao do sexo masculino (30.109), mas "a prática desportiva no feminino continua a ser um problema não só em Portugal, mas a nível europeu", reconhece Vítor Pataco.

"A Europa tem na agenda um programa que Portugal se associou já desde 2018, o "All In", que tende a desenvolver ações para alcançarmos a igualdade de género. Neste momento, a prática desportiva feminina é de 30%, mas o objetivo é naturalmente que ela atinja os 50%. É um objetivo ambicioso, mas que é alcançável", acredita.

Em Portugal, o futebol é agora uma das modalidades que "tem mais potencial de crescimento" entre as mulheres, sublinha Vitor Pacheco, que enaltece a aposta da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) no desenvolvimento do futebol feminino.

"Nos últimos quatro anos, a Federação aumentou cerca de 25% a prática desportiva no feminino. Mas também temos modalidades em que a prática feminina é superior à masculina como é o caso do voleibol que tem cerca de 55% de praticantes femininos ou a ginástica, que também é praticada maioritariamente pela população feminina."

Vitor Pataco recorre ao exemplo do Programa Nacional de Desporto para Todos (PNDpT), criado pelo governo em 2014 e gerido pelo IPDJ, que tem permitido financiar projetos desportivos com a prática desportiva feminina "sobrevalorizada".

"No último programa, que atingiu cerca de meio milhão de pessoas, cerca de 250 mil foram no feminino. Portanto, conseguimos a paridade do ponto de vista do alcance do programa, e isso é um motivo de satisfação", diz Vitor Pataco sublinhando que este é um caminho que também sido feito por algumas autarquias que "valorizam a prática feminina e beneficiam financeiramente os clubes no apoio às suas atividades regulares".

"As câmaras municipais despendem cerca de 320 milhões euros por ano para o desenvolvimento da prática desportiva nos junto dos clubes e isso é uma ajuda importante", remata.

Portugal nos 15 países mais ativos da Europa até 2030

De acordo com a Organização Mundial da Saúde, 30% das crianças e jovens portugueses dos dez aos 19 anos tem excesso de peso. Destes, 8% sofrem mesmo de obesidade. Mas Vítor Pataco acredita numa tendência de desagravamento, sublinhando a aposta que tem sido feita em programas que incentivam à prática desportiva entre os mais jovens, como Sistema Universal de Apoio à Vida Ativa (SUAVA).

“O programa tem o objetivo de até 2030 colocarmos Portugal nos 15 países fisicamente mais ativos da Europa. Uma das componentes está relacionada com a mobilidade nas escolas. E, por isso, disponibilizámos já cerca de 21 mil bicicletas nas escolas para que os jovens possam não só fazer a aprendizagem do ciclismo, como também ter essa mobilidade suave em bicicleta". Além disso, o programa inclui "um kit de bicicletas que podem também ser usadas fora da escola por pais, familiares e naturalmente os próprios alunos que se podem deslocar de casa para a escola."

Sem detalhar pormenores, o presidente do IPDJ revela ainda que, em 2025, deverá estar em pleno funcionamento uma plataforma eletrónica que "vai permitir uma relação direta com o cidadão" e "desafiá-lo a ser ativo, a frequentar instalações desportivas e informá-lo sobre o que pode fazer".

"Se conseguirmos passar para a coluna dos ativos cerca de 3 milhões de pessoas até 2030, Portugal fica num posicionamento bastante favorável em termos europeus e no que toca àquilo que é uma população ativa. E isso, depois, tem repercussões diretas em tudo o que tem a ver com custos de saúde, com diminuição dos custos de segurança social, com o aumento da produtividade no trabalho, etc", remata.