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​Pastoral do Turismo. “Saber acolher” é um desafio ainda maior este verão

21 jul, 2020 - 06:30 • Ângela Roque

Responsável pela Pastoral do Turismo diz que a procura de novos destinos para férias obriga as comunidades católicas a estar mais atentas para receber quem chega. Para o padre Carlos Godinho, a Igreja pode e deve ajudar à recuperação do setor, disponibilizando património.

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A necessidade de férias mais recatadas, em locais com menos gente, está a levar mais portugueses a locais onde nunca tinham ido, e isso está a trazer novos desafios à Igreja. Para o diretor da Obra Nacional da Pastoral do Turismo, as comunidades que recebem turistas – e sobretudo aquelas onde isso não era habitual – devem estar preparadas para acolher quem as visita.

Em entrevista à Renascença, a propósito da recente Nota Pastoral “Turismo em tempo de pandemia”, o padre Carlos Godinho diz que a Igreja também tem um papel a desempenhar na recuperação da atividade turística, pondo ao dispor o seu património. E alerta para a necessidade do país não desperdiçar os quadros que formou nos últimos nesta área de atividade.

A Igreja retomou as celebrações comunitárias, embora com várias restrições. Neste verão tão atípico por causa da pandemia, que desafios traz este "novo normal" à Igreja e, em particular, às comunidades que recebem turistas?

Este verão traz a necessidade de um acolhimento maior, embora com os condicionalismos que todos estamos a viver, porque vamos ter uma desconcentração de turistas, sobretudo do turismo interno, em várias comunidades.

É preciso haver esta disponibilidade, não apenas nos grandes centros, que as pessoas costumavam procurar para fazer as suas férias, mas num espaço mais alargado, inclusivamente num espaço de natureza e de montanha, e ter este cuidado de acolhimento das pessoas. Sabendo, naturalmente, que estamos todos sujeitos às restrições nos espaços de culto, com as limitações que isso terá, mas é preciso saber acolher as pessoas nessas circunstâncias.


Na recente nota pastoral “Turismo em tempo de pandemia” alerta para a necessidade de reorganização da atividade turística, para que quem foi formado nesta área nos últimos anos "não se perca no desemprego". Diz também que a Igreja pode ajudar, disponibilizando património. É um desafio que deixa à Igreja?

O turismo – que teve um desenvolvimento grande nos últimos anos, e estava em crescendo até fevereiro – é uma atividade de pessoas para pessoas, e devemos privilegiar esta dimensão humana. Dependemos muito de quadros e pessoas que se empenharam e se formaram para responder às necessidades do Turismo em Portugal. Ora, agora nós não podemos abandonar essas pessoas, sobretudo quem tem vínculos mais precários.

A redução da atividade pressuporá uma redução da necessidade de trabalhadores nesta área, mas esperemos que a atividade se retome no futuro e que possamos garantir o trabalho a estas pessoas. É nesse sentido que na Nota Pastoral proponho aproveitar esta ocasião para outras atividades, por exemplo de formação, com apoios, naquele que é um quadro da responsabilidade do Estado e das instituições próprias ligadas ao turismo – como o Turismo de Portugal e a Confederação do Turismo. E depois até - não sei é viável, ou não - a possibilidade de criação de uma Bolsa de Emprego, onde estas pessoas possam ter lugar e ser depois requisitadas quando retomarmos a atividade.

E a Igreja também tem aqui um papel a desempenhar?

Claro que há aqui uma responsabilidade da Igreja, perceber que temos um património riquíssimo, que não é nosso, está à guarda da Igreja, mas é da comunidade, e que a Igreja tem de saber disponibilizar, em primeiro lugar abrindo as igrejas, e depois ajudando a fruir esse património.

Poderá ser com um pequeno grupo de gente voluntária que acolhe e que dá algumas indicações, dentro daquilo que é o possível, mas o ideal seria sinalizar o património, até eventualmente com algum guia que possa ajudar a interpretar esse mesmo património e descodificar a linguagem própria e toda a simbologia que encerra. A Igreja tem aqui uma responsabilidade grande nesse sentido, como elemento que pode ser propulsor e pode contribuir para o desenvolvimento da atividade turística.

Mas, o turismo religioso também está a ser afetado pela atual crise...

Naturalmente. Usando a linguagem própria do turismo: “todos os produtos” estão a ser afetados, porque o turismo assenta na mobilidade de pessoas e neste momento há uma fraca mobilidade.

Este ano teremos, sobretudo, um turismo mais interno, as campanhas vão muito nesse sentido, haverá uma dispersão maior no território, já notamos isso neste momento. As pessoas não procuram tanto os espaços de grandes aglomerados, o que também é um valor, a não massificação, com todas as consequências que isso traz, até do ponto de vista ambiental.

Haverá uma dispersão maior, sobretudo pelos espaços naturais, de contacto com a natureza, o que permite também a dimensão da contemplação e do encontro com Deus, através dessa mediação da própria natureza, a partir da Criação chegar ao Criador. O que será um desafio, nesse sentido, para todas as comunidades cristãs: estar atento a quem chega, e aquelas que têm de facto algum tipo de oferta, devem acolher devidamente e contribuir assim para o desenvolvimento desta atividade.


No turismo, em geral, esta pode ser uma oportunidade de o repensar em termos de oferta. A Igreja também tem de encontrar novas respostas a este nível?

Sim. Portugal é um país relativamente pequeno, muito rico na sua diversidade, mas temos concentrado muito o turismo: a zona litoral, e particularmente o Algarve, são destinos de excelência e muito procurados, por causa do sol e da praia. Temos alguns polos fundamentais nas grandes cidades, muitas até de litoral, mas depois temos uma riqueza imensa no interior, como as aldeias de xisto, as nossas serras, toda a zona raiana, temos espaços belíssimos de história e de cultura, e nesse sentido temos muito para oferecer.

A Igreja tem aqui um papel importante, no sentido de disponibilizar o património neste contexto, e de promover essa oferta de uma forma mais intensa. E é preciso não ficarmos a pensar num contexto eclesial, em termos de turismo religioso, que porventura só os espaços de grande concentração de turistas é que podem beneficiar, ou têm o dever, até pastoral, de responder às necessidades dos turistas. Não. É preciso incentivar a que haja uma resposta efetiva a quem nos procura, e acho que há uma responsabilidade da Igreja também a este nível.

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