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Vaga de incêndios em igrejas em território indígena no Canadá

30 jun, 2021 - 18:55

Os incêndios parecem ser uma forma de retaliação pelo papel desempenhado pela Igreja na tentativa de erradicar a cultura das tribos indígenas no Canadá, mas os chefes tribais dizem que estes atos apenas agravam a dor dos seus membros.

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Pelo menos seis igrejas foram incendiadas nos últimos dias no Canadá, todas localizadas em território pertencente às chamadas “primeiras nações”, as tribos indígenas daquele país e esta quarta-feira ardeu uma sétima igreja, localizada fora destes territórios.

A vaga de incêndios, ao que tudo indica de origem criminosa, surge na sequência de um escândalo que tem abalado o país, com a descoberta de centenas de valas comuns junto a antigas escolas residenciais que eram operadas na sua maioria por instituições religiosas e tinham como propósito contribuir para a erradicação da cultura indígena.

Segundo as autoridades canadianas quatro das sete igrejas, quase todas católicas exceto uma, que é anglicana, estavam num raio de distância que se pode percorrer numa hora de carro, levantando a suspeita, não confirmada, de que tenham a mesma autoria. Embora pareça certo que os incêndios nas igrejas localizadas em território das tribos nativas estejam relacionados, não está confirmada uma ligação ao incêndio que ocorreu esta quarta-feira em Morinville, no Alberta.

A motivação para esta vaga de fogos-postos não é ainda conhecida ao certo, mas os próprios nativos parecem convencidos de que se trata de uma retaliação pelo papel desempenhado pelas igrejas na exploração dos colégios.

Contudo, os líderes comunitários têm sido unânimes na condenação dos atos. “Se a comunidade tivesse vindo ter connosco e dito que queria remover as Igrejas tê-lo-íamos feito, da melhor maneira. Mas que uma pessoa tenha feito isto sem o consenso da comunidade… É terrível para aqueles que usam a Igreja”, disse o chefe Keith Crow, dos índios Similkameen.

A chefe Sandra Larin, dos Gitwangak, recorda que estas igrejas ainda são um local de consolo espiritual para muitos.

“Compreendo a hostilidade e a necessidade de se encontrar uma forma de sarar as feridas, mas esta igreja foi construída pelos nossos antepassados no final do Século XIX, pelas mãos dos nossos anciãos, com um grande sentido de orgulho. Ainda há muitos nesta aldeia que têm uma fé religiosa forte e formal e que encontram consolo nisso”, disse, condenando os incêndios.

Cerca de 150 mil crianças indígenas frequentaram os colégios internos, sendo que muitas eram separadas dos seus pais à força e levadas para as escolas contra a vontade das famílias. Nas instituições eram educadas ao estilo ocidental e proibidas de manter as suas tradições ou falar as suas línguas nativas.

As crianças eram retiradas às suas famílias pelo Estado e enviadas para as escolas que estavam confiadas a congregações religiosas. Cerca de 60% das escolas eram exploradas por congregações católicas. A prática viria mais tarde a ser repudiada pelas autoridades, mas deixou cicatrizes nos povos nativos e tem sido apelidada de uma tentativa de “genocídio cultural”.

Cerca de seis mil das crianças morreram nas escolas, mas não existem suspeitas de que tenham sido assassinadas. Antes, a revolta prende-se com o facto de terem morrido longe das suas famílias, a quem em muitos casos eram retiradas, e de terem sido sepultadas em valas comuns e em sepulturas não identificadas.

O primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, disse que já falou com o Papa Francisco e que lhe comunicou a necessidade de o Santo Padre pedir perdão aos indígenas canadianos pelo papel desempenhado pela Igreja neste episódio histórico, e que esse pedido de desculpas deve ser feito em território canadiano.

O Papa já lamentou publicamente o que se passou, mas não existem planos atualmente para uma viagem ao Canadá.

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