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Trabalho pode ser digital, mas tem que ser digno

08 out, 2020 - 06:58 • Ana Carrilho

A pandemia acelerou o recurso às formas de trabalho digital, o que trouxe aspetos positivos, mas também revelou grandes fragilidades para os trabalhadores. Este foi o mote para o debate online organizado esta noite pela LOC/MTC (Liga Operária Católica/Movimento Trabalhadores Cristãos) e a Práxis -Reflexão e Debate sobre Trabalho e Sindicalismo.

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O objetivo do Trabalho Digno entrou nas prioridades da Organização Internacional do Trabalho (OIT) há cerca de duas décadas. E na comemoração do centenário da organização, no ano passado, a digitalização assumiu-se como tema central para o futuro do trabalho.

No debate online organizado pela Liga Operária Católica/Movimento Trabalhadores Cristãos (LOC/MOC) e a Práxis, na quarta-feira à noite, a representante da OIT em Portugal, Mafalda Troncho, referiu-se a um relatório recente sobre as plataformas digitais e revelou a existência de dois modelos: um em que as empresas estão baseadas na web mas fornecem serviços localmente; outro onde estão as plataformas que permitem a contratação em tempo de real de trabalhadores dispersos por todo o mundo.

Ora, se no primeiro caso, pode haver regulação conforme a legislação de cada país, no segundo, terá de haver um sistema de governo internacional, caso contrário, será “terra de ninguém”, frisou Mafalda Troncho.

Um estudo sobre as cinco maiores plataformas digitais, com trabalhadores em 75 países revelou vários tipos de trabalho atípico: trabalhadores a tempo inteiro contratados por vários empregadores; um posto de trabalho para vários trabalhadores; trabalhadores temporários, trabalho à solicitação; teletrabalho; trabalho pago com vouchers; um trabalhador independente em serviço para vários prestadores, o trabalho colaborativo ou o crowdwork, em que uma multidão de trabalhadores está disponível para uma plataforma que faz ligação a múltiplos empregadores.

A pandemia acelerou o recurso às formas de trabalho digital, nomeadamente através das plataformas ou o teletrabalho. A digitalização no trabalho tem aspetos positivos, mas o seu uso intenso também revelou grandes fragilidades para os trabalhadores. É, pois, preciso aproveitar esta “oportunidade de ouro” para regular este tipo de trabalho.

E esse é o grande desafio, considera Mafalda Troncho, nomeadamente para a OIT e governos, que devem criar quadros e políticas reguladoras que permitam aproveitar as oportunidades e eliminar os riscos.

“Ninguém pode ficar para trás, ninguém pode ficar sem proteção social. A pandemia pôs a nu a grande precariedade das relações laborais e a desproteção social a que estão sujeitos milhões de trabalhadores em todo o mundo. É preciso reforçar o diálogo social e aproveitar a oportunidade de ouro para regular a sério, em todos os países”, defendeu.

Diferenciar a amálgama de realidades

O trabalho digital é diferente do trabalho através de uma plataforma e este não é mesma coisa que o teletrabalho. São realidades diferentes que, na opinião do professor de Economia Nuno Teles, “do ponto de vista sindical, teremos a ganhar se as conseguirmos diferenciar”.

Referindo -se às plataformas como a Uber ou a Glovo, frisa que estas empresas não investem na formação dos trabalhadores: “a grande inovação da Uber é o GPS. Permite a desqualificação do trabalho e a sua consequente desvalorização”.

Em vários países, os tribunais impuseram às plataformas a obrigação de se assumirem como empregadoras. “Em Portugal, houve um deslumbramento tecnológico com as plataformas e não se fez nada para defender os trabalhadores. Em Londres, a Uber perdeu a licença (temporariamente) por não querer assumir uma relação laboral com os seus trabalhadores”.

Por isso, o professor de Economia na Universidade Federal da Baía, no Brasil, alerta que é preciso recuperar a negociação coletiva e fortalecê-la.

Muitos trabalhadores das plataformas não querem ser reconhecidos como tal, mas sim como prestadores de serviços e isso é um problema para o movimento sindical. “Para a dignidade do trabalho, há algo muito importante: um contrato de trabalho”.

Qual é o estatuto dos trabalhadores das plataformas?

Carlos Trindade, sindicalista e representante da CGTP no Conselho Económico e Social da União Europeia, encontra resposta para a insistência da maioria dos trabalhadores das plataformas se assumirem como prestadores de serviços.

Explica o argumento do “assim, sou mais livre” com a alienação sob um conceito de subjugação: as empresas não pagam impostos nem contribuem para a Segurança Social em relação ao seu trabalho e eles também não. Carlos Trindade conclui que “daqui a 20-30 anos vão ser um enorme encargo para sociedade”.

Atualmente, os trabalhadores das plataformas pesam cerca de 1,4% do mercado de trabalho europeu e a tendência é para o crescimento. Essa foi uma das razões que, segundo o sindicalista, levou a Presidência alemã a pedir um parecer ao Comité Económico e Social Europeu (CES).

É que as plataformas, por princípio, recusam-se a assumir o papel e as responsabilidades de empregadores. Assumem-se como intermediárias entre o consumidor e o prestador de serviços, não têm sedes, não pagam impostos ou contribuições.

No entanto, nalguns países já foram derrotadas. Por exemplo, em Espanha, o tribunal obrigou a Glovo a contratar as pessoas que trabalham com a plataforma.

Carlos Trindade revelou que a discussão no Conselho Económico e Social Europeu se centrou na definição de um Estatuto do Trabalhador (da plataforma), que assim já pode organizar-se, lutar e defender os seus direitos.

O parecer do CES foi aprovado por 85% dos membros, ou seja, com os votos de boa parte das organizações empresariais.

Quanto ao teletrabalho, Carlos Trindade considera que “é o maior embuste dos nossos tempos; é uma ilusão de liberdade”.

Trabalho Digno: uma prioridade para a Igreja e o Papa

“Não existe pior pobreza do que aquela que priva o homem do trabalho e da dignidade do trabalho”. Foi a citação do Papa Francisco que Abraham Canales, dirigente da Hermandad Obrera de Accion Catolica, de Espanha, usou para mostrar a importância que o Trabalho Digno tem para a Igreja e para os movimentos católicos. E, sobretudo, a “luz e a esperança que pode trazer nestes tempos de mudança em que o impacto da pandemia no trabalho, com mais tecnologia, se faz sentir”.

Fazer pontes e favorecer o diálogo, com o objetivo de promover o trabalho decente para todos: trabalhadores respeitados, que possam satisfazer as suas necessidades essenciais, falar e ser escutados, organizar-se livremente e assegurar condições de vida digna. É uma prioridade do Pontificado de Francisco, expressa em várias ocasiões, nomeadamente na Exortação Apostólica “Evangellii Gaudium” ou nas encíclicas “Laudato Si” e “Fratelli Tutti”, divulgada no fim de semana.

Para Abraham Canales, a tecnologia, que “nos dá muitos benefícios e oportunidades, também pode ser um obstáculo ao desenvolvimento sustentável”.

Defende, por isso, organizações fortes como a OIT, o movimento sindical e a Igreja, que contribuam para evitar o sofrimento de milhões de pessoas que mesmo na economia digital, têm situações laborais muito precárias, com muita informalidade.

“Acontece em muitos países em que só se pensa na rentabilidade e em que facilmente se descartam trabalhadores”, disse.

O debate online inseriu-se na comemoração do Dia Mundial pelo Trabalho Digno, que se assinalou na quarta-feira, 7 de outubro.

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