01 ago, 2024 - 07:00 • Susana Madureira Martins (Renascença) e David Santiago (Público)
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Em entrevista à edição especial do programa Hora da Verdade da Renascença e do jornal Público, Joaquim Miranda Sarmento explica que o Governo abdicou de agir face aos problemas da Inapa para evitar “uma nova Efacec”. O ministro das Finanças considera que a situação da distribuidora de papel “decorre da gestão da empresa”, não revelando quanto é que o Estado perde com a insolvência.
Antes da pausa para férias, o ministro de Estado e das Finanças diz que a privatização da TAP se mantém como um objetivo do Governo e que há duas condições para a operação: a manutenção do hub e, “se possível”, a sua ampliação e crescimento, para além do encaixe financeiro que permita “mitigar” os quase 4 mil milhões de euros que foram injetados na companhia aérea a partir de 2020.
Foi conhecida esta semana a nomeação de Luís Morais Sarmento para o Banco de Portugal. É o início de uma mudança integral da administração do regulador, incluindo, dentro de um ano, a saída de Mário Centeno de governador?
Há vários reguladores que neste momento não têm os seus conselhos de administração completos. Os reguladores são uma parte fundamental da atividade económica e da política económica, pelas funções muito importantes que exercem nos respetivos setores.
Entendemos que os reguladores devem ter os seus conselhos de administração completos. Estamos a iniciar o processo de nomeação daqueles em que não estão completos. E, nesse sentido, entendemos nomear o doutor Luís Morais Sarmento, que é quadro do Banco de Portugal, é diretor adjunto, já foi diretor-geral do Orçamento.
Partilha comigo o último nome, mas não tenho nenhuma relação familiar, embora eu tenha muita estima pessoal por ele.
Entendemos que é uma pessoa que contribuirá para a missão do Banco de Portugal e para a qualidade do trabalho que o Banco de Portugal faz.
Como é que avalia o mandato de Mário Centeno à frente do banco central?
Mostrei-me preocupado com a dimensão dos prejuízos que o Banco de Portugal tinha tido, com a redução dos rácios das reservas. Naturalmente, não faço considerações sobre aquilo que é o mandato do senhor governador.
O mandato do governador do Banco de Portugal é independente. O Banco de Portugal deve ser independente e deve atuar dentro das suas competências e é isso que lhe compete.
Mas terá uma palavra a dizer quando o governador terminar as funções. Acha que deve ser ou não reconduzido?
Estamos a um ano disso, é extemporâneo falarmos dessa situação.
Já em outubro termina o mandato de José Tavares à frente do Tribunal de Contas. Admite reconduzir?
Essa é uma decisão que o Governo terá de tomar.
Ainda não está tomada?
Não, não. Acho que avaliaremos essa situação a seu tempo. Não vale a pena especular. Tenho muita estima pessoal também pelo doutor José Tavares. Faremos a avaliação e a decisão compete ao Governo.
E Paulo Macedo, que demonstrou querer continuar à frente da Caixa Geral de Depósitos. Terá o OK do Governo?
Outra pessoa por quem tenho uma enorme estima pessoal.
Falou de estima pessoal em relação a todos esses nomes, menos em relação a Mário Centeno.
Não, porque no caso do doutor José Tavares e do doutor Paulo Macedo conheço-os bem, já privei muitas vezes com eles. Com o doutor Mário Centeno privei muito menos, mas, naturalmente, não tenho nenhuma acrimónia com o doutor Mário Centeno. Sucede que conheço melhor as outras duas pessoas que referiu.
Em relação a privatizações, a única que o Governo quer fazer é a da TAP. Há algum calendário para a operação acontecer? Por que é que ainda não avançou?
Tudo aquilo que possa dizer diminui a vantagem negocial do Estado português.
Então é porque está alguma coisa a acontecer.
Nós temos dois objetivos para a venda da TAP. A manutenção do hub e o encaixe financeiro. Tudo o que eu possa revelar publicamente sobre o que está ou não está a acontecer diminui a capacidade negocial do Estado português. Eu não farei isso.
É a melhor altura para privatizar uma empresa que está a dar lucro?
Quando há prejuízo é mais difícil privatizar. A decisão que temos no programa eleitoral e no Programa do Governo é privatizar a empresa com estes dois objetivos. Manutenção do hub e até, se possível, a sua ampliação e
crescimento. E o encaixe financeiro que permita mitigar aquilo que foram quase 4 mil milhões de euros de dinheiro dos contribuintes que foi colocado na companhia aérea a partir de 2020.
HORA DA VERDADE
Numa edição especial do Hora da Verdade da Renasce(...)
O Governo português quer libertar-se desse rótulo dos 4 mil milhões de euros?
Quer privatizar uma empresa que entende que é melhor gerida nas mãos de privados.
Já definiu percentagens?
Não. Mais uma vez, isso faz parte do processo negocial.
Em relação a um tema que está na ordem do dia, a gestão da Inapa acusou o Governo de ter decidido deixar cair a empresa sem ter dados para tomar essa decisão. É justa a crítica e, por outro lado, quanto é que o Estado arrisca perder numa liquidação da empresa?
A situação da Inapa decorre da gestão da empresa. A empresa viu-se com uma situação de rutura de tesouraria na Alemanha e aquilo que o Governo fez foi defender o dinheiro dos contribuintes.
Colocar dinheiro numa empresa, numa operação para proteger 800 empregos na Alemanha, não nos pareceu a melhor utilização dos dinheiros públicos e não quisemos ter, ao contrário do Governo anterior, uma nova Efacec a sugar dinheiro dos contribuintes, a despejarmos dinheiro dos contribuintes nessa empresa. Agora veremos o que é que acontece, se há compradores para aqueles ativos ou se a empresa segue um processo de insolvência.
Na sequência deste caso, o Governo admite rever aquelas que são as participações empresariais do Estado? Se sim, num sentido de diminuição do peso do Estado nessas empresas?
Neste momento, além da privatização da TAP, já decorriam, quando nós tomámos posse no dia 2 de abril, dois processos de alienação de empresas no âmbito da Parpública, o Circuito do Estoril e o Hospital da Cruz Vermelha. São processos que continuarão, seguirão o seu trâmite. Neste momento, não temos nenhuma decisão tomada sobre mais nenhuma participação.
O PS tem dito que todas as medidas que o Governo já aprovou, sem as da oposição, valem 2 mil milhões de euros. Quais é que são as contas do Governo?
Não valem, não valem. O que é inédito, o que é novo na democracia portuguesa, é ver o Parlamento a aprovar medidas com impacto orçamental que vão em sentido contrário do Programa do Governo. Se as medidas do Governo têm uma expressão orçamental um pouco superior, porque é que o valor não é aquele que o PS apresenta? Primeiro, o PS coloca na coluna do Governo o apoio à Ucrânia, mas o apoio à Ucrânia é algo que já vem do Governo anterior e eu acho que é algo, qualquer governo manteria.
Que este Governo aumentou ligeiramente.
Por compromissos internacionais. O PS coloca o acordo com os professores e com as forças de segurança, mas o PS não faria esses acordos? E até faria, pelo menos em montantes iguais, àquilo que o Governo decidiu.
Não sabemos se o PS faria igual porque o PSD tem dito que resolveu um problema que o PS não foi capaz de resolver.
Terá de perguntar ao secretário-geral do PS se não teria feito acordo com os professores e com as polícias. Olhando para aquele documento, se calhar não teria.
Depois a habitação. Aquilo é um reforço de verbas nacionais de uma suborçamentação do PRR, como explicou o ministro da Coesão. O valor para executar aquelas 26 mil casas tem que ser superior. Depois o PS coloca o IRC. O IRC não tem impacto orçamental em 2025. Depois coloca o IRS, mas o IRS aprovado é uma medida do PS no Parlamento.
Na realidade, se formos ver aquilo de que o PS discorda e que tem impacto para 2025, é apenas o IRS Jovem. Que em 2025, por via das retenções na fonte, terá um impacto na ordem dos 700-800 milhões de euros. Do outro lado está, para 2025, o IVA da eletricidade, 110 milhões, as portagens, 180 milhões, e se quisermos, o IRS, que são mais de 500 milhões. Ficamos com valores muito semelhantes. Quando, mais uma vez, e só para terminar, aquilo que seria normal salutar em democracia era que o Governo decide e no Parlamento vota-se a favor ou contra as decisões do Governo. O que já não é normal é dois partidos, PS e Chega, quererem governar a partir do Parlamento. A isso é que nós nunca tínhamos assistido.